quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

VICIADAS EM PAIXÃO

Por Florbela Espanca
Existem mulheres que não conseguem ficar sozinhas... Você é uma delas?
"Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!"
Ai, a paixão! Quem nunca ficou à mercê deste sentimento que espalha calafrios pelo corpo e faz o coração palpitar mais forte? Segundo os neurocientistas, o organismo dos apaixonados produz grandes doses anfetaminas naturais como dopamina, norepinefrina e feniletilamina. São elas as responsáveis pela euforia típica que tira os nossos pés do chão, mas também podem causar dependência. Isso explica o comportamento das pessoas incapazes de relacionamentos amorosos duradouros, sempre à procura de novas aventuras, que saltam de um parceiro para o outro. Elas são viciadas em paixão.
Você sabia que o vício de paixão está ligado ao vício de adrenalina? As pessoas dependentes de paixão "amam" essa sensação provocada pela adrenalina no corpo. Elas gostam da sensação de gostar, de apaixonar-se
A paixão é um estado alterado da consciência e pode ser bastante perturbador. O nível do sentimento pode chegar a um estágio que dizemos ser patológico, ou seja, doentio
Para a antropóloga e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Mirian Goldenberg, esta busca ininterrupta pela paixão faz parte de toda mulher. "De certa forma, todas nós somos viciadas em paixão, somos educadas para acreditar que é possível viver permanentemente apaixonadas e queremos isso. Somos educadas pelas novelas, filmes e romances a acreditar na paixão. Mas, na vida real, ela dura pouco com o mesmo parceiro. Assim, buscamos novas paixões, acreditando que elas podem durar. Não duram e o processo continua", explica.
Mirian diz, ainda, que este é um sintoma do comportamento contemporâneo. "O vício pela paixão é um fenômeno cultural e se torna um imperativo na sociedade moderna que valoriza o novo, a aventura e as experiências intensas". Já para a psicóloga Ana Cristina Calil, na maioria das vezes, este comportamento pode ser uma forma de não querer lidar com a dor. "As pessoas estão cada vez mais reativas, com medo de se relacionar. A troca de parceiros aponta para o medo de sofrer, de amar, como se houvesse uma correlação entre os dois", afirma a especialista.
E o pior: este temor é inconsciente. "Estas pessoas nem sempre reconhecem o medo. Ele está encoberto. As pessoas agem sem pensar. É uma forma de proteção", garante Ana Cristina. A psicóloga Clarissa Fernandes também chama atenção para as frustrações do passado. "Falhas na formação emocional básica do indivíduo, em especial na capacidade de suportar frustrações, podem ser a causa deste comportamento apresentado por algumas pessoas", esclarece.
Clarissa ainda alerta para os perigos da paixão. "A paixão é um estado alterado da consciência e pode ser bastante perturbador. O nível do sentimento pode chegar a um estágio que dizemos ser patológico, ou seja, doentio", adverte.
Vamos, então, usar duas nomenclaturas para diferenciar os tipos de paixão: a "paixão doentia" não evolui para o amor, pois se trata de um sentimento provocado por carências e dificuldades emocionais do indivíduo. Já a "paixão normal" é o enamoramento, que pode (ou não) evoluir para um amor maduro, saudável e duradouro. Este tipo de paixão é um sentimento agradável, que traz a sensação de felicidade.
Como dá para perceber, quando a paixão não é patológica, ela é positiva. Não há mal algum em ter um coração volátil, estar bem resolvida e querer alguém para dar uns beijos na boca, curtir a vida e - quem sabe? - deixar a porta aberta para o amor. Mas, para isso, a auto-estima deve estar lá em cima.
Segundo uma pesquisa feita pela professora Cindy Hazan, da Universidade Cornell de Nova York, as substâncias que controlam este sentimento são encontradas juntas no corpo humano apenas durante as fases iniciais do flerte. Com o tempo, o organismo vai se tornando resistente aos seus efeitos, e toda a loucura e a atração vão sumindo. O casal, então, se vê frente a uma dicotomia: ou se separa ou habitua-se a manifestações mais brandas de amor - companheirismo, afeto e tolerância -, permanecendo junto.